Circuitos de rua tendem a ser todos muito semelhantes: pista ondulada e estreita, e traçado com esquinas e hairpins, sem muitas oportunidades de acelerar forte ou disputar posições. Mas como todos sabemos, regras sempre têm exceções e por isso alguns circuitos de rua podem ser realmente alucinantes e até mesmo assustadores.

Depois de sugerir o circuito de Pau, na França, com seus paredões de pedra e meios-fios disfarçados de zebra, perguntamos aos nossos quais são os circuitos de rua mais tenebrosos do planeta. Aqui estão as respostas.

 

AVUS – Berlim, Alemanha

AVUS foi um circuito alemão idealizado para testes e corridas de automóveis no começo do século XX (leia a história completa neste post especial do FlatOut). Ele consistia em duas retas de quase oito quilômetros de extensão ligadas por duas curvas de 180 graus. A curva ao sul era plana, mas a curva Norte tinha a inclinação absurda de 43º (Indianápolis tem 11º), o que significa que, depois de atingir velocidades a 300 km/h, você literalmente subia uma parede que não tinha nenhum tipo de barreira no lado externo.

Logicamente nem sempre tudo dá certo, e alguns pilotos acabaram voando por cima do paredão, como o piloto francês Jean Behra (que morreu no acidente) e o jornalista-piloto alemão Richard Frankenberg, que milagrosamente sobreviveu à queda de 15 metros. Ao longo dos anos o circuito foi sendo reduzido até que, em 1995, o acidente fatal de Kieth O’dors fez com que o automobilismo moderno abandonasse o antigo circuito.

 

Circuito da Guia – Macau, China

O Circuito da Guia em Macau (uma antiga propriedade portuguesa na China) é, de certa forma, uma mistura de Mônaco com Nürburgring. Ele tem pista estreita (são apenas sete metros no ponto mais estreito) e ondulada, com poucas chances de ultrapassagem e fica no centro de uma grande cidade.

Mas diferentemente da maioria dos circuitos de rua, o circuito da Guia tem variação de altitude — são cerca de 30 metros de diferença entre a parte mais baixa e a mais alta, além de uma reta ultra-longa que permite velocidades acima de 260 km/h nos carros de Fórmula 3 e curvas fechadas e técnicas, que dificultam o acerto do carro.

O circuito foi idealizado em 1954 e desde então o traçado nunca foi modificado. Durante algum tempo houve uma área de escape com brita, mas depois da reforma dos pits e do paddock, a área foi removida.

 

Snaefell Mountain Course – Isle of Man

São quase 61 km e mais de 200 curvas pelas ruas e estradas da Ilha de Man, que são fechadas pelo parlamento local para formar o circuito usado no lendário Tourist Trophy. Diferentemente de boa parte dos circuitos de rua, devido à sua extensão ele não tem separação física entre pista e elementos urbanos como postes, meios-fios, muros e cercas. Há apenas algumas barreiras de protecão em pontos críticos do circuito, mas nenhum deles se parece com o que vemos nos autódromos mais seguros da atualidade.

Previsivelmente, ele é o circuito que mais fez vítimas fatais na história do esporte motorizado: de 1911, quando ele foi formado pela primeira vez até 2014, nada menos que 245 pilotos perderam a vida em Snaeffel.

 

Circuito de Mônaco

O mais tradicional circuito da Fórmula 1 é relativamente seguro atualmente — especialmente depois da chicane ao fim do túnel, que reduziu significativamente as velocidades. Além da pista estreita e da entrada do túnel desprotegida, o circuito tem curvas fechadas e nenhuma área de escape.

Nelson Piquet certa vez disse que “andar em Mônaco é como a andar de bicicleta dentro de um apartamento”, uma analogia perfeita. Nos anos 1950, quando ainda não havia barreiras de proteção, não era difícil cair na água ao perder o controle do carro e, mesmo depois das modificações, bastava um segundo de distração para errar o traçado e abandonar a prova, como aconteceu com Senna em 1988.

 

Targa Florio – Itália

A Targa Florio foi uma corrida de endurance realizada na Sicília entre 1906 e 1977 em circuitos formados por rodovias públicas da ilha italiana. O primeiro traçado somava 148 km, e os pilotos precisavam dar apenas uma volta para concluir a corrida. Entre 1912 e 1914 o circuito passou a cobrir todo o perímetro da ilha, totalizando nada menos que 975 km, e depois 1.080 km entre 1948 e 1950. A partir de 1951 até 1977, quando foi realizada a última edição foi idealizado um circuito menor de 72 km.

Em qualquer uma das configurações a primeira dificuldade era memorizar o traçado. Depois vinha o fato de ser totalmente realizada em vias públicas, sem barreiras, nem guard rails para proteger os carros dos penhascos que ladeavam alguns trechos dos circuitos.

Nos anos 1970, o circuito de 72 km foi considerado perigoso demais para o WRC — o mesmo WRC que aceitou o Grupo B anos mais tarde —, imagine então o que era correr ali com carros de 300 ou 400 cv nas rodas traseiras e ninguém para ler pace notes. Sem contar que você cruzava cidades e eventualmente podia topar com carros e pedestres.

 

The Triangle/North West 200 – Irlanda do Norte

The Triangle é o apelido do circuito formado por rodovias entre as cidades de Portstewart, Coleraine e Portrush, na Irlanda do Norte, para a disputa da North West 200. Assim como Snaefell Mountain, ele não tem guard rails, áreas de escape ou qualquer outro elemento de segurança além de umas barreiras em pontos estratégicos. Repare no vídeo acima como o piloto brasileiro Rafael Paschoalin chega perto das guias durante as curvas. Insano.

O circuito é bem mais curto que Snaefell, tem pouco mais de 14 km, mas permite que se atinja velocidades acima dos 320 km/h, como Martin Jessopp, que chegou a 335 km/h nos treinos da edição de 2012. A corrida é disputada desde 1979, e deste então 20 pilotos morreram ali — uma média, felizmente, bem inferior que a do Tourist Trophy.

 

Circuito de Pescara – Pescara, Itália

O fato de ter o circuito mais longo a sediar um GP da Fórmula 1 já é suficiente para ser assustador. Eram 25,8 km percorridos nas estradas italianas, que usavam marcos de pedra como marcação dos quilômetros e eram onduladas e estreitas. Sofra uma batida no exato oposto da ambulância e você está morto. O negócio era tão assustador que Enzo Ferrari nem inscrevia sua equipe para as provas realizadas ali.

A última corrida em Pescara foi uma prova de quatro horas válida para o Mundial de Carros Esporte, em 1961. Depois disso os organizadores das provas decidiram que era inviável organizar uma corrida segura por ali e assim o circuito deixou de ser usado para sempre.

 

Dundrod Circuit – Irlanda do Norte

O Dundrod Circuit é outro circuito de motos da Irlanda do Norte, muito semelhante ao Snaefell Mountain e ao Triangle. A principal diferença é que ele não passa por dentro de cidades, o que reduz significativamente o número de postes e muros para bater e morrer.

Ele também é o mais curto desses circuitos, com “apenas” 11 km de extensão. Até os anos 1950 ele era usado para corridas de carro, como a clássica RAC Tourist Trophy, além das corridas de moto. É o circuito de motociclismo mais rápido do mundo, com recorde de velocidade média de 214 km/h obtido pelo piloto Bruce Anstey em no Ulster GP de 2010.

 

San José Grand Prix — San José, EUA

Os americanos sempre foram muito criativos para criar circuitos de rua. Eles já montaram um circuito de F1 até mesmo no estacionamento de um cassino, em Las Vegas, então o que pode ser mais louco do que isso?

Que tal um circuito com trilhos de bonde cruzando o caminho dos monopostos da Champ Car? Não é piada: o circuito de rua armado em San José, na Califórnia tinha trilhos cruzando a chicane entre as curvas 4 e 5. Logicamente os carros saltavam e os pilotos eram quem sofriam com a ideia totalmente excelente dos organizadores. Alguns chegavam a reclamar de dores fortes na cabeça depois de algumas voltas. Felizmente, alguém de bom-senso percebeu que aquilo era absurdo demais e a corrida deixou de ser disputada em 2007, depois de três edições.